terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Quarta e quinta semana: o natal e o alívio




Meu bebê lindo,


É assim que eu tenho chamado você. A cada dia que passa, o meu amor e a minha saudade só aumentam, Cauê. Os nossos dias são tão corridos e intensos, mas quando voltamos pra casa, as horas custam a passar. Eu sinto o seu cheiro o tempo inteiro, eu sinto a sua presença, eu sinto o seu toque, eu sinto muito, muito a sua falta. Seu pai tem sido incrível, meu amor. Ele tem feito de tudo pra me ajudar a lidar melhor com a sua ausência. Ele me encoraja, me dá ânimo e me faz sorrir. Ele cuida tão bem da gente. Eu e você somos dois sortudos por ter ele em nossas vidas, sabia?

Nesses dias aconteceu algo muito mágico, bebê lindo. Paulinha, uma das técnicas de enfermagem que a mamãe chama de "tia em forma de anjo", colocou você nos meus braços de um jeito diferente: de frente pra mim, entre os meus seios. Apesar da roupa que eu tenho que usar na UTI, eu pude te sentir mais perto. Foi um contato tão especial, tão forte. Num determinado instante, você começou a me cheirar esfregando o seu nariz contra mim. Aí você foi tentando sair dali do meio e descendo em direção ao meu seio. Eu fui te deixando ir e quando você chegou bem perto, a sua boca começou a fazer um barulho estranho. Só aí eu percebi que você estava tentando mamar. Foi tão lindo, filho. Eu fiquei muito emocionada e jurei que te amamentaria um dia. Eu estou orando muito e fazendo tudo o que eu posso para isso acontecer. Por enquanto, mainha tem tirado leite numa bomba elétrica pra você tomar na sonda e aí ganhar peso e crescer.

Semana passada você fez um mês, Cauê. Lá no hospital eles deixam os pais levarem algo pra enfeitar a incubadora por alguns dias e a gente levou um balão que era uma estrela azul. As tias em forma de anjos fizeram um cartaz com várias mensagens lindas e colaram na incubadora. A mamãe guardou pra te mostrar um dia. Nesse mesmo dia foi o natal, filho. E a essa altura, você já deve saber a real importância dessa data: o aniversário de um cara muito especial: Jesus Cristo. Essa é uma data que representa, entre tantos outros sentimentos, a união das famílias. Só que você, parte essencial da nossa família, fisicamente, não estava lá. E por isso doeu muito essa noite de natal. Muito. Muito mais do que eu imaginei que doeria. Isso porque nada mais faz sentido ou tem graça sem você, Cauê. Mas o amor do seu pai, dos seus avós, da sua tia Aya e, principalmente, o meu amor por você e a minha fé em Deus, tem me capacitado a tirar forças pra viver longe de você.

Porém, o acontecimento mais forte e intenso dessas duas semanas foi o resultado de um exame. É que você nasceu com um cabelo diferente, filho. Ainda não sabemos bem o porquê, mas agora o teu cabelo está quase todo caindo. A primeira suspeita dos médicos foi que você teria uma deficiência de cobre no sangue. Uma dia eu te explico com detalhes sobre isso. Como eu sou ansiosa e pesquisaria sobre essa deficiência na internet, o seu pai pediu à médica pra não me falar nada. Ele contou as suas avós e manteve segredo para me poupar. Deu certo por alguns dias. Porém, três dias antes do resultado, eu soube da maneira mais fria possível, mas não quero falar disso aqui. Então, quando eu contei ao seu pai, ele fingiu que ainda não sabia e me fez prometer que eu não pesquisaria nada porque a internet é cheia de informações desencontradas. Ele já havia pesquisado e não me disse. Ainda bem que eu ouvi o seu pai, meu amor.

Foram três dias que pareceram três anos. Eu estava muito ansiosa, nervosa e aflita. Eu juro que tentei não pensar no pior, mas é tão difícil, Cauê. A mamãe não é tão forte quanto pensam e muito menos uma super heroína, você já deve saber disso, não é? Eu e seu pai oramos muito, conversamos muito e dizemos a Deus que ficaríamos do seu lado, amando-o e te amparando, não importaria o resultado do exame. Dia 26 de dezembro foi mais uma vitória sua, meu guerreiro. Eu e seu pai chegamos cedo no hospital, mas o resultado só saiu às 14:30 h. Eu estava contigo na UTI quando as meninas disseram que o resultado tinha chegado. Eu fiquei tão nervosa que saí correndo pra chamar o seu pai. Eu precisava segurar na mão dele. Nós estávamos no corredor quando a médica veio até a gente e nos deu a notícia que você não tinha a deficiência. Nós começamos a chorar e nos abraçamos de um jeito único. Uma energia incrível nos envolveu naquele instante. Em seguida, todas as técnicas de enfermagem e enfermeiras saíram da UTI e foram nos abraçar e comemorar. Foi um momento lindo que eu vou guardar eternamente na memória do coração.

Se você tivesse essa deficiência, você só viveria por, no máximo, 6 anos e não leria esse texto agora, filho. A deficiência de cobre é uma doença muito grave e rara, meu amor e que graças a Deus, ao amor dele, você não tem. Eu tenho certeza que você sairá dessa batalha diária pela vida sem nenhuma sequela, mas seja como for, saiba desde já que eu e seu pai estaremos ao seu lado para o que der e vier.

Você tem nos ensinado tanto, Cauê. Sobre paciência, respeito, fé, esperança e acima de tudo, sobre amor. Continua lutando, bebê lindo. Nós vamos fazer valer à pena. 

Eu te amo, filho...de um jeito que nunca imaginei sentir igual.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Segunda e terceira semana: amizade e mudança de perspectivas



Cauê, meu amor


Eu achei que daria pra escrever aqui ao menos uma vez por semana, mas mainha não vai conseguir fazer isso sempre. Os dias estão corridos, cansativos, eu passo quase o dia inteiro no hospital com você e à noite mainha tem a nossa casa pra organizar, o seu quarto pra terminar, as suas roupinhas pra lavar, leitinho pra tirar e depois eu só quero dormir pra que a noite passe logo e com o raiar do dia eu possa voltar pra perto de ti. Aquela UTI neonatal virou uma extensão de nossa casa, meu amor. É onde eu me sinto feliz e em paz porque você está ali.

Essas últimas duas semanas foram muito importantes, filho. Você fez diversos exames que descartaram alguns problemas de saúde que poderiam ser graves, o leite de mainha começou a sair numa quantidade maior e eu e seu pai vivemos momentos bem especiais contigo. Seu pai te colocou nos braços pela primeira vez e esse dia foi muito comemorado por nós. Já eu tive você junto a mim por quase 30 minutos e as técnicas de enfermagem, as tias em forma de anjo, fizeram um vídeo lindo dessa tarde inesquecível. Nessa última semana você atingiu suas primeiras 800 gramas. Tem dias que você perde algumas gramas, outros você ganha....e assim vamos vivendo e agradecendo um dia e uma grama de cada vez.

Semana passada, três amigos muito queridos vieram do Rio de Janeiro e de São Paulo só para nos ver e nos dar uma força, filho. Pena que eles não puderam entrar na UTI e te conhecer, mas a presença deles foi muito importante para mim e para o seu pai. A Ju e o Rei tem uma história de amor bem parecida com a minha e a de PR e o filho deles, o Pedro, que ao ler esse texto já deve ser teu amigo carioca, é um bebê muito amado por mim. Eu tenho um carinho por ele que não sei explicar de onde vem. A Ju tem sido muito companheira comigo desde o início da gravidez e ela já te deu tantos presentes que dá pra fazer uma coleção e denominar "presentes da tia Ju"....rsrsrs. Foi muita consideração e carinho deles com a gente, filho. Nós jamais esqueceremos disso. Amizades verdadeiras são um presente de Deus, lembra sempre disso, meu amor.

A Pri chegou de São Paulo no mesmo dia em que a Ju e o Rei foram embora. Ela está morando em Lisboa e há quase dois anos não vinha para o Brasil. Alguns meses atrás, após decidir a data de sua chegada, ela me fez uma surpresa linda e disse que viria para Recife só para me ver grávida e fazer o ensaio de gestante aqui (ela é uma fotógrafa incrível). Pena que não deu tempo, mas faz parte, filho. Nem tudo na vida é como planejamos ou sonhamos. Como já dizia Carlos Drummond, um dos poetas preferidos da mamãe e que eu lia pra você na gravidez: "a dor é inevitável, o sofrimento é opcional". E sim, doeu quando eu vi a Pri no aeroporto, o meu coração ficou pequeno e doeu perceber, sentir o que poderia ter sido e não foi. Lembra que a mamãe falou que ainda não se acostumou a não estar mais grávida de você? Pois é, eu continuo em processo de adaptação, Cauê. Só que a Pri me ajudou a mudar de perspectiva, filho. Ela mudou o meu modo de encarar algumas coisas, ela foi comigo todos os dias para o hospital, ela nos ajudou a decorar o seu quarto, ela melhorou o meu astral e a minha energia. Ela é uma das pessoas mais incríveis que eu já conheci em toda a minha vida.

Por falar em seu quarto, ele está quase todo pronto, filho. E eu prometo a você e a Pri que eu e seu pai vamos terminar ele logo porque ela me ensinou que agindo assim, sem medo de encarar a sua ausência ali, é uma forma de acreditarmos de todo o coração que esse tempo em que estamos longe fisicamente passará logo. Pra mim, desde o dia 24/11, os dias estão se arrastando, demorando a passar, mas vai passar. Cada dia a mais é um dia a menos. E cada dia a mais, a gente te ama e te deseja mais aqui, em nossa casa.

Continua lutando, meu guerreiro. Vai valer a pena.

Nós te amamos e continuamos esperando você.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Sua primeira semana: medo e amor





Meu amor,

Passamos pela nossa primeira semana, Cauê. Foram dias bem intensos. Alguns mais doídos, outros mais felizes, mas muito, muito intensos. Como eu te disse no último post, a mamãe teve alta na quinta-feira, 27/11. Esse foi o dia mais difícil pra mim. Eu já não consegui dormir na noite anterior e não consegui parar de chorar desde o primeiro raio da manhã. Eu nunca senti nada parecido com aquela dor, mas já passou. Vamos falar do que foi bom?

No dia seguinte, logo cedo, mainha foi ao hospital pra tirar leitinho pra você e te ver. Filho, eu estava muito ansiosa. Eu tomei um bom banho, procurei um vestido bem bonito, um brinco que eu adoro e coloquei só um pouquinho de perfume. Eu estava louca, desesperada de saudades de você. O caminho inteiro eu fui com meu coração disparando, comecei a tremer, parecia que eu ia ter um encontro amoroso...rsrsrs. Você ainda não deve saber o que é isso agora ao ler esse texto, mas um dia você vai se apaixonar e talvez lembre dessas sensações que mainha tá dizendo.

Ao chegarmos, o seu pai foi logo te ver e eu fui tirar leite pra você. Estamos nos dividindo assim: ele fica contigo e eu vou para um setor da maternidade chamado "ordenha" pra garantir o teu alimento. Meu amor, quando eu entrei e te vi, a minha boca estava seca e eu abri a incubadora quase sem delicadeza, louca pra te tocar. A tua incubadora tem um cheiro muito especial, filho. Só que ninguém sente. Só eu. Seu pai já tentou sentir, as enfermeiras e técnicas de enfermagem também, mas ninguém consegue sentir o que eu sinto. É o cheiro de alguma planta, flor....algo da natureza. Eu nunca senti nada parecido para poder comparar, mas eu costumo dizer que é o seu cheiro. A tia Renata, uma das técnicas que cuida de você, disse pra mim que deve ser o cheiro do seu anjinho de guarda e que só eu consigo sentir. Que fofo, não é? Eu só sei que estou viciada nesse cheiro e sinto ele perto de mim quase que o dia inteiro.

Até o domingo, 30/11, eu ainda "não te conhecia", filho. Isso porque você usava uma máscara para proteger os olhos do banho de luz e estava usando um aparelho para ajudar na respiração que meio que escondia você. E nesse dia, um ensolarado dia de domingo, eu e seu pai fizemos o mesmo: ele foi te ver e eu fui tirar o leitinho. Quando eu saí da ordenha e fui te ver, na entrada da UTI a Dra Karla, pediatra que está acompanhando você, disse que eu teria uma surpresa. Meu coração, pra variar, disparou. Lavei as mãos, passei o álcool gel e seu pai veio me receber com um sorriso enorme no rosto. Ele saiu, eu entrei e finalmente a surpresa: eu conheci você. Você tinha saído do aparelho que cobria teu rosto e agora estava com um que permitia que a gente te visse. Cauê, eu fiquei perdidamente apaixonada por você. Você é o menor bebê que eu já vi na vida e mesmo ainda todo em formação, eu achei você o bebê mais lindo do mundo todo.

Só que o melhor desse dia ainda estava por vir, filho. As tias em forma de anjos me disseram que eu ia colocar você em meus braços. E o mais incrível, Cauê: um dia antes eu perguntei a elas quando isso iria acontecer e elas me disseram que deveria demorar um pouco, mas que esse dia ia chegar. E chegou em menos de 24 horas. Foram só dois ou três minutos, filho. Os minutos mais bonitos que eu já vivi. Eu, literalmente, pulei de alegria quando elas foram te pegar e nem liguei pra cirurgia, eu só queria você. O mundo parou naqueles minutos, filho. Eu chorava sem parar e não lembro de nada do que aconteceu ao meu redor. Eu pude olhar seus detalhes, tocar sua frágil pele, sentir levemente você. As tias em forma de anjos deixaram seu pai ver tudo da porta e ainda tiraram várias fotos lindas da gente. Eu passei a lembrar daquele momento com o carinho e a leveza que eu ainda não consigo lembrar do dia do seu nascimento. Mainha ainda vai levar um tempo para compreender tudo o que aconteceu. Não estar mais grávida de você ainda tem sido difícil pra mim.

Durante essa primeira semana também houve momentos de tristeza, filho. Faz parte do processo de amadurecimento de um prematuro extremo como você, mas eu prometo que vou tentar contar por aqui só o que foi bom. O lado negativo disso tudo a gente logo vai esquecer, então eu só vou resumir. O lado bom a gente vai guardar, conversar, rir e se emocionar muito durante toda a nossa vida, por isso esse lado merecerá mais detalhes. É uma questão de escolha, filho. E eu e seu pai escolhemos assim. 

Eu e PR estamos mais unidos do que nunca e o nosso amor por você só cresce. Os dias estão muito corridos, cansativos, mas graças a sua avó Vera, seu avô Ary, seus tios Soraya e Daniel, sua tia Débora e especialmente, sua tia Luciana, essa primeira semana foi vivida com união, força e muita fé. Por sinal, meu amor, guarde esse nome e essa pessoa no seu coração: tia Lu. Sem ela com a sua amizade, sua disponibilidade, sua clareza e seu amor, os dias de mainha estariam muito mais difíceis do que estão. Ela tem sido o anjo de guarda de nós dois.

Continua na luta, meu guerreiro. Nós estamos no caminho certo.

Eu te amo, Cauê.

E continuamos esperando você.